Estou deitada no sofá
assistindo Netflix. Sofia está sobre o tapete, à minha frente, tomando seu sol
matinal enquanto se lambe inteira. Charlotte se espreguiça dentro da caixa de
sapatos que está sobre a mesa da sala. Estamos em nossas posições preguiçosas
de domingo.
Olho minha cortina: está
rasgada e cheia de fios puxados. Como é possível duas gatinhas detonarem um
tecido desse jeito? Parece que as duas sabem o que estou pensando, pois me
olham de um jeito como se dissessem: Ei, humana, relaxe, é só um pedaço de pano.
Nunca me esqueço da
primeira vez que me chamaram de gateira, foi uma amiga apaixonada pelos bichanos
que me deu as boas-vindas ao seu mundo. Mas tenho que confessar: antes de
adotar minhas gatas, nem sabia o que era isso. A vida era mais fácil. Naquela
época, ração, areia, petiscos, brinquedos e sachês de comida úmida não faziam
parte da minha lista de compras e nem das minhas preocupações.
Agora, eu converso com
gatos. Charlotte tem vários tipos de miados. Quando ela quer brincar ou quer
que eu abra a porta, os miados são curtos e sequencialmente rápidos. Se está
com sono, boceja miando. Se bate a fome, o som é agudo e insistente. E se quer
que eu a pegue no colo para dar-lhe beijos e abraços, mia baixinho.
A inteligência desses animais é tão incrível que alguém profetizou: “os gatos dominarão o mundo”. Por exemplo: a Sofia está tratando uma bronquite que surgiu no inverno. A danadinha já sabe o horário da medicação, e é só eu entrar no banheiro e abrir a gaveta onde guardo o remédio, que ela corre para debaixo da cama.
A única coisa que me
incomoda, às vezes, são os pelos. E não é por falta de cuidado. Estou sempre
escovando as gatinhas. Passo aspirador de pó (“o monstro”, segundo elas)
praticamente todos os dias, mas os teimosos pelos permanecem em todo lugar. Mas,
então, olho para as meninas (é assim que as chamo) e me derreto quando elas
fazem contato visual comigo, fechando os dois olhos calmamente: este é um sinal
de conexão entre gatos e humanos, como se fosse um beijo.
O jeito foi me acostumar
com pelos nas toalhas, nas roupas de cama e no sofá. Aparece pelo no chão minutos
depois que passei o aspirador de pó. Já achei pelos em lugares inusitados, como
dentro da geladeira e do freezer! Ser gateiro é uma coisa muito louca mesmo:
você se acostuma a sair de casa com a roupa cheia de pelos e isso se torna algo
normal. É que ter os pelos com a presença dos gatos é bem melhor do que não ter
pelo nenhum e nem os bichanos.
Descobri que ser gateiro
é também fazer parte de um mundo caracteristicamente felino — e todo mundo sabe
disso. Já ganhei bolsa térmica, moleskine, caneca, chaveiro, camiseta, almofada,
cartão-postal, íma de geladeira, pulseira, pingente, toalhinha e estojo com
desenho de gato. Vira e mexe, alguém vê algo relacionado a gatos e vem me contar.
Recebo vídeos engraçados dos bichos o tempo todo. Uma leitora, que se tornou
minha amiga virtual, bordou à mão um quadrinho contendo duas gatas e os nomes
Charlotte e Sofia.
Por outro lado, já me
disseram que é exagero eu fazer do meu apartamento um lar de gatos: tem
playground vertical na parede e arranhadores pela sala, sem falar das cangas estiradas
sobre as cadeiras para formar uma cabana. Na entrada, tem um capacho escrito:
“Bem-vindo à casa do gato e do seu humano”. É que ser gateiro é mais do que
gostar de gatos, é ser um feliz escravo deles.
Assim, só consigo
concluir que somos, mesmo, exagerados — e adoramos isso! Se antes eu não fazia
questão de passar o domingo vendo televisão e era mais apegada às coisas
materiais, hoje sou capaz de passar o dia esticada no sofá, enquanto vejo as
gatas dormirem, e esperando elas acordarem para a nossa rotina de brincadeiras,
lambejos e carinho.
Ser gateiro é mais do que gostar de gatos, é ser um feliz escravo deles publicado primeiro em https://www.revistabula.com
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