Seguramente, caso houvesse um censo dos heróis favoritos no Brasil, Goku
estaria em qualquer lista popular respeitável. Figura carismática, engraçada,
extremamente forte, dócil e inocente, o personagem principal da franquia “Dragon
Ball” possui virtudes que o tornam único. Seus objetivos, no entanto, demonstram
um traço pouco abordado de seu perfil: o egoísmo. O foco em se tornar cada vez
mais forte o fez indiferente e pouco afeito a atitudes altruístas.
Antes de tudo, é interessante estabelecer um breve conceito do que faz
de alguém um herói. A rigor, seria aquele que praticamente abdica de sua vida
cotidiana para se dedicar à proteção comunitária, tendo ou não poderes para
tanto. Munido de sentimentos e valores morais invejáveis, extraordinário em sua
bravura, o herói suporta dores incalculáveis para dar auxílio a quem, muitas
vezes, sequer conhece; por isso é admirável e cultuado. O herói é, antes de
tudo, um ser elevado e sobre-humano, justamente por não apresentar os defeitos mais
rudimentares inatos na maioria das pessoas.
Goku não nasceu humano. Oriundo de um planeta distante, foi mandado para
a Terra pelo pai ao perceber que seu planeta natal seria destruído, num enredo
bastante parecido com a história de outro herói — o Super-Homem. Ainda bebê,
foi encontrado e criado por um senhor chamado Grandpa (vovô) Gohan, que logo
notou seu temperamento explosivo e violento. Um dia, Goku bateu a cabeça e
mudou completamente de comportamento. Apesar disso, quando avistava a lua cheia
transformava-se em um macaco gigante descontrolado e perdia a consciência por
completo. Numa dessas, matou o próprio avô.
Goku cresceu com o ímpeto de se tornar cada vez mais poderoso. Sua
diversão sempre foi a de aprender novas técnicas, derrotar inimigos e procurar
desafios. Ele nunca teve o intuito de sair por aí para salvar pessoas em
perigo; proteger inocentes acabou sendo efeito colateral e fortuito de suas
aventuras. Nesse quesito, Goku respeita sua memória genética, tendo em vista
ser da raça dos Saiyajin, notórios e obstinados assassinos mercenários. Durante
as sagas Cell e Boo, inúmeras passagens indicaram essas características,
valendo salientar que o próprio Akira Toriyama, criador da série, declarou
publicamente que lutar pela justiça não seria bem um objetivo de Goku.
Além dessa personalidade pouco altruísta, Goku também demonstra frieza e
distância em seu núcleo familiar. A gana pelas batalhas o levou a ser um pai
displicente. Seu primogênito, Son Gohan, foi praticamente criado por um pai
adotivo, o senhor Piccolo. Do segundo, Goten, apenas conheceu o rosto quando o
garoto já tinha seus sete anos. Mais uma vez, seu comportamento evidencia
traços de sua raça Sayiajin, cuja característica despreza valores familiares, baseada
em uma educação espartana com objetivo de amadurecer crianças para serem
guerreiros desprendidos de vínculos afetivos.
Por tudo isso, Goku está distante de ser um verdadeiro herói. Seus atos ao
salvar a Terra são mais ligados a interesses próprios que à busca da paz. Além
disso, sendo um péssimo pai, sobrecarregou a esposa, numa relação afastada e
indiferente. Porém, é bom que se diga, Goku não tem como não ser considerado um
personagem espetacular. Amável, amigo, disposto a sacrificar a própria vida em
muitas ocasiões, é abonado em qualidades. Um ser poderoso, capaz de atos heroicos,
mas muito questionáveis se examinados mais a fundo. Certamente, todos gostariam
de ser Goku ou tê-lo como amigo. Mas ter um pai ou um marido como ele… Aí são
outros quinhentos!
Desconstruindo um mito: Goku não é assim tão herói e nunca foi um exemplo como pai publicado primeiro em https://www.revistabula.com