sábado, 7 de março de 2020

Enfrente o machismo de cabeça erguida. Ele revela o medo do poder da mulher

Enfrente o machismo de cabeça erguida. Ele revela o medo do poder da mulher

Vou profanar. Neste 45º Dia Internacional da Mulher começarei
pelo fim: a história do machismo estrutural brasileiro é a confissão do medo do
poder feminino. Por que entreguei logo o desfecho do meu raciocínio? Porque
temos pressa. Depois de 45 anos de celebração mundial, o contexto dos direitos
deste 8 de março é muito pior do que a situação nos anos 1970, quando a data
foi criada.

Estamos perdendo espaço
de luta já consolidado no país e a equidade de gênero tem sido violada como
muitas de nós já fomos. O respeito à causa tem perdido espaço em uma velocidade
assustadora. Estamos mais desprotegidas. Há mais chances de sermos ainda mais
espremidas em nossas relações: desconhecidos, chefes, amigos, parceiros, irmãos,
pais e até filhos. Infelizmente, o feminicídio pode ser o desfecho mais
frequente.

É que vivemos em um país
que, hoje, reforça oficialmente o preconceito contra a mulher. O presidente da
república legitima publicamente a violência moral e física contra as
brasileiras. Seja inferiorizando a própria filha ao considerar o nascimento
dela uma “fraquejada” dele por ela ser menina. Ou quando acusa a jornalista
Patrícia Campos Mello de troca de favores sexuais por informação dizendo em tom
jocoso que a profissional ‘queria dar o furo de qualquer jeito’. Isso porque
ela fez uma reportagem sobre disparos em massa de fake news por whatsApp
na campanha de Bolsonaro.  Ao cometer esse
pacote de crimes — de responsabilidade (falta de decoro presidencial), assédio
moral, injúria, difamação e derivados — e não ser punido, outra vez o Estado estimula
(a parcela da população adepta ao discurso sexista) a ofender, oprimir, bater,
estuprar e até matar. É tão lamentável que não há palavra suficientemente capaz
de expressar tudo o que isso significa.

Vejo esse fenômeno como
um processo de deseducação generalizada que destapou a maldade e agressividade
que já habitava em muitos de nós. Entendo que a inferiorização da mulher de hoje
dialoga com a estrutura patriarcal de ontem. E que a situação só começou a ser
desfeita porque a crise econômica obrigou as mulheres a trabalhar também fora
de casa. Concluo que tudo isso vem do medo do poder feminino.

Para começar, reside em
nós a tarefa de gerar a vida. Do nosso seio, sai alimento. Do nosso peito,
pertencimento.  A parte da educação que
define a estrutura emocional dos filhos, na fase de 0 a 2 anos, é quase 100%
desenvolvida pela mãe. Porém isso é apenas uma parte de nosso poder.

Homens perceberam que
possuímos o dom da argumentação e mesmo em situações de desigualdade
conseguimos ter alguma voz. Quando podemos exercer nosso potencial de forma
justa, somos cientistas, filósofas, artistas, jornalistas, cozinheiras,
pedreiras, caminhoneiras e um infinito de possibilidades. E, quando transformamos
opressão em luta, reconhecemos que somos tão capazes quanto homens e temos valor
único corremos para avisar as outras. Queremos todas unidas para exercermos
nossas existências livremente. Isso pode ser entendido como ameaça por aqueles
que educados sob a premissa que a força do homem é baseada na desvalorização da
mulher. A esses, um esclarecimento simplificado: os maus tratos às mulheres
falam mais da desvalia do homem do que da mulher. Exigimos respeito porque
também respeitamos vocês. Não desejamos ser mais que ninguém. O feminismo é o
movimento por direitos IGUAIS entre homens e mulheres. Nosso tamanho nos serve
porque nossa potência é infinita.

Parafraseando Clarice Lispector, ‘felizmente nasci mulher. Sou o quê? Um quase tudo’. Vou profanar. Termino pelo começo: não queremos mais que o justo. Exigimos apenas a consideração que qualquer pessoa merece. No Dia Internacional da Mulher e em todos os outros dias.

Imagem: Mark Mook / Pixabay

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