Dando-se uma volta de três minutos no banheiro de alguma das (milhares de) academias por aí, tudo o que se ouve são projetos. O negócio parece escola de engenharia, até que se entenda a intenção por trás das falas: projeto-verão, projeto-Cancun, projeto-noiva, projeto-carnaval… É tanto projeto que Niemeyer morreria — de novo — de inveja. Uma voltinha nos aparelhos e já se pode produzir um artigo científico sobre termogênicos, esteroides, repositores energéticos, proteínas, vitaminas, pró-hormonais e hormônios.
Dando-se uma volta de três minutos no banheiro de alguma das (milhares de) academias por aí, tudo o que se ouve são projetos. O negócio parece escola de engenharia, até que se entenda a intenção por trás das falas: projeto-verão, projeto-Cancun, projeto-noiva, projeto-carnaval… É tanto projeto que Niemeyer morreria — de novo — de inveja. Uma voltinha nos aparelhos e já se pode produzir um artigo científico sobre termogênicos, esteroides, repositores energéticos, proteínas, vitaminas, pró-hormonais e hormônios.
Cultuar o corpo não é exclusividade do século 21. A beleza escreveu sua história dentro da História, trazendo, desde sempre, orgulho, frustração, inveja e determinação. Desde a Grécia, o culto à forma física perfeita tem-se feito presente, com maior ou menor força, em registros de historiadores, deixando suas marcas nas pessoas e na arte (estão aí Vênus de Milo e Davi para provar).
Só que hoje os recursos químicos são acessíveis, e os publicitários, sem dó nem piedade, parecem encontrar acolhida em todo canto: redes sociais, revistas, televisão, site de buscas, rádio, outdoors e tudo mais que possa atrair a atenção dos pobres e inconformados mortais. De forma raramente honesta, vendem que um corpo bem esculpido é o caminho certo para obter poder, admiração, dinheiro e sucesso na “pegação”. É difícil assistir a uma propaganda e não se deixar seduzir pela ideia de que possuir um corpo sarado e consumir Victoria Secrets, Calvin Klein ou Abercrombie certamente farão qualquer pé-rapado se tornar um monumento. Mais difícil ainda é ver um aparelho Polishop ou chá emagrecedor e não cair na tentação de adquiri-los. Vai que, né?
Para cada parte teoricamente imperfeita do corpo, existe uma solução: cirurgia de nariz, estica e puxa de cabelo, prótese para tudo quanto é lugar, creme para olho, injeção para rugas, choque elétrico para flacidez, pigmento para sobrancelha… É como se fôssemos um conjunto de infelizes imperfeições até que nos rendamos àquelas mágicas soluções. Aí, já com tudo devidamente retocado e no lugar, vêm os certeiros e apontam (na maioria das vezes, com razão): essa brincadeira tomou-lhe muitos dinheiros e acabou deixando-o mais velho. “Ah, o bonito mesmo é a beleza natural”. Veja Gisele Bündchen, veja as propagandas de sabonete e protetor solar. Sejamos todos “naturalmente” fresh and young, pois está na moda subverter a moda. E você acredita. E uma infinidade de redes sociais passa a vender fotos de cabelos calculadamente ao vento, maquiagens estrategicamente naturais e comidas calóricas falsamente ingeridas, mas muito bem fotografadas. Bonito mesmo é ser “naturalmente” bonito. Mas essa suposta naturalidade exige tanto ou mais recurso do que uma produção confessadamente complexa. Estamos ficando mesmo malucos.
O problema não é a vaidade em si, tampouco as intervenções cirúrgicas providenciadas, os blogs de moda, os termogênicos ou os publicitários. O problema é a criatura achar que a vida se resume a isso. Em saudação à mulher de trinta, Balzac destilou seu veneno: “Deve-se deixar a vaidade aos que não têm outra coisa para exibir”. Talvez o escritor esteja exigindo demais do homem médio, já que a completa ausência de vaidade é privilégio de raras almas muito evoluídas. Mas há aí uma verdade inegável: quem se entrega apenas à vaidade de seu corpo provavelmente tem pouco a oferecer. É a lei da compensação.
O culto ao corpo e o atrofiamento dos cérebros bombados publicado primeiro em https://www.revistabula.com
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